quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A Sociologia da arte



Por: : Raíssa Moreira Lima Mendes*

Neste livro, Nathalie Heinich expõe as várias formas de se pensar a arte em relação à sociedade, apresentando as escolas e filosofias envolvidas historicamente e metodologicamente. Fazendo uso de inúmeros autores e recortes históricos, traça o curso do pensamento sociológico contemporâneo sobre a arte. Faz o recorte a partir das artes plásticas, literatura e música, de acordo com ela, as mais estudadas hoje e dá ênfase particular nas primeiras, que produziram as pesquisas mais numerosas e mais ricas de novas perspectivas.

Na primeira parte, contempla a história da disciplina, já que segundo a autora, para compreender o que a sociologia da arte é, e para que nos situemos em meio a resultados desiguais e numerosos é indispensável a reconstituição de seu histórico, o que a autora faz distinguindo três gerações cronológicas e intelectuais, a da estética sociológica, da história social da arte e a da sociologia de pesquisa (pág. 19).

Já na segunda parte, expõe os principais resultados da sociologia de pesquisa em função de suas grandes temáticas: recepção, mediação, produção e obras. Por fim, destaca as possibilidades levantadas pela disciplina para compreensão de que a mesma se constitui num verdadeiro desafio à sociologia, sabendo que se a sociologia da arte tem como missão compreender melhor a natureza da experiência e dos fenômenos artísticos, ela deve também, consequentemente, levar a Sociologia a refletir sobre sua definição e seus limites.

Explica que é de uma “história cultural da arte” que provêm os trabalhos que poderão ser relidos como premissas de uma sociologia da arte e que esta nasceu entre os especialistas de estética e de história da arte, preocupados em operar uma ruptura com o binômio artista/arte introduzindo como terceiro termo ”a sociedade” (pág. 26).

Assim a primeira geração refere-se á uma “estética sociológica, primeira metade do século 20, na tradição marxista e entre historiadores de arte atípicos por volta da Segunda Guerra Mundial. A segunda, durante a segunda guerra, a “história social da arte”, preocupada com os contextos em que evoluem as obras, com uma relação de inclusão da arte na sociedade. E a terceira seria a da sociologia de pesquisa, desenvolvida graças aos métodos modernos provenientes da estatística e da etnometodologia, considerando a arte como sociedade, o conjunto das interações dos autores das instituições, dos objetos, evoluindo juntos de modo a fazer existir o que chamamos comumente de arte, tendo como principais centros França e Estados Unidos e França, não tendo a universidade mais do que um papel secundário (págs. 27 e 28).

A sociologia de pesquisa, portanto, faria uma investigação empírica aplicada à época presente e não mais a documentos do passado, interessando-se pelo funcionamento do meio em que se dá a arte, seus autores, suas interações, sua estrutura interna, pelos processos de que das obras, grandes ou pequenas, são a ocasião, a causa ou a resultante (pág. 61). Para isso, vale-se do recurso da enquete (pág.62).

Assim, os sociólogos da arte podem proceder à pesquisa das regularidades que governam a multiplicação das ações, dos objetos, dos autores, das instituições, das representações, compondo a existência coletiva dos fenômenos compreendidos pelo termo “arte” (pág. 64). E para apresentar os resultados dessa sociologia de pesquisa a autora adota o seguinte recorte dos diferentes momentos da atividade artística: recepção, mediação, produção e obras (pág. 64). Começa pela recepção, que seria o momento de “pôr no mundo” a atividade artística, por querer diferenciar a abordagem sociológica da dos especialistas de arte, que geralmente terminam sua abordagem tratando da recepção (pág.69). Abordando, para tanto, a morfologia dos públicos, a Sociologia do gosto, as práticas culturais, percepção estética e admiração artística. Ao tratar da mediação, explora as pessoas, instituições, palavras e coisas bem como uma teoria da mediação, abordando sua hierarquia específica. Quanto à produção, destaca o papel da morfologia social, e uma Sociologia da dominação, também o que poderia ser uma Sociologia Interacionista e uma Sociologia da Identidade. A respeito das obras, detalha a injução ao falar das obras e a questão do relativismo, da interpretação e observação, propondo uma sociologia pragmática.

Assim, ao tratar das tendências atuais, sugere que o que interessaria à pesquisa é aquilo o que produz a arte e o que ela mesma produz como elemento de uma sociedade ou “configuração” (termo que ela toma de Norbert Elias), esta seria a tendência das direções mais inovadoras da sociologia da arte recente, substituindo as grandes discussões metafísicas pelo estudo concreto das situações. Para tanto, afirma que a arte é uma forma, entre outras, de atividade social, possuindo suas próprias características (pág. 63).
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Segundo a autora, a arte contemporânea desconstrói as categorias cognitivas, permitindo construir um consenso sobre o que é arte, de forma muito m ais segura do que ela relata o estado da sociedade industrial ou mesmo o status dos artistas na modernidade. Deste modo, o sociólogo pode debruçar-se sobre as “obras em si mesmas”, demonstrando em que elas desconstroem os critérios tradicionais de valoração ou em que elas produzem ou ativam estruturas imaginárias (pág. 140).

De acordo com ela, não é buscando interessar-se pelos objetos, ou pelas obras ou pelas pessoas, ou pelas “condições sociais de produção” que o sociólogo faz obra especificamente sociológica em matéria de arte, e sim interessando-se pela forma pela qual os atores, de acordo com as situações, investem neste ou naquele momento para assegurar seu relacionamento com a arte e com o valor artístico. Assim, não caberia ao sociólogo escolher seus objetos e sim deixar-se guiar pelas mudanças dos atores no mundo em que vivem (pág. 143).

Para a socióloga, após recorrer a exemplos de pesquisas neste âmbito, afirma que a sociologia de pesquisa da terceira geração provou que a sociologia da arte pode responder aos critérios de rigor, aos métodos controlados e aos resultados positivos que atestam a pertença de uma disciplina às ciências sociais, e não mais às tradicionais “humanidades”, dotando as pesquisas a partir dos anos 60 de qualidade e sugerindo que as mesmas suscitariam as opções entre diferentes escolas, morfologia social, sociologia da dominação, sociologia interacionista, sociologia da mediação, sociologia dos valores, sociologia da singularidade (pág. 145). A autora, como já dito, discorre sobre cada uma delas e as implicações advindas da escolha de cada abordagem.
Não se trata, portanto, de afirmar a ligação entre a arte e a sociedade, porém, deve-se levar em conta a socialização, já que constitutiva de todo indivíduo, assim também o seria da atividade artística, como de toda atividade humana (pág. 146). Assim, sugere a autonomização da disciplina, através da pesquisa empírica, estatística, entrevista, observação ou análise pragmática das ações em situação o mais próxima possível da realidade, condições mínimas para tal intento (pág. 147).
 Sugere ainda uma sociologia dos modos de recepção, das formas de reconhecimento e condição dos produtores, ao invés da centralização numa sociologia das obras de arte (pág. 147). Propõe também que se escape do sociologismo, que considera o geral como fundamento, mas que se tenha como enfoque uma sociologia verdadeira, onde o sociólogo sairia do reducionismo. Sua proposta ainda pauta-se no abandono da crítica, onde não mais argumenta as controvérsias mas analisa, limitando seu espaço de competência, não tendo de decidir se os atores “têm razão” mas mostrando quais são suas razões. Por fim, propõem que se saia da explicação para a compreensão.

A autora vislumbra o surgimento de uma quarta geração, que complementaria as anteriores, prolongando-as para além de uma perspectiva essencialista e normalista, voltando-se para uma direção mais antropológica e pragmática, estendida à compreensão das representações e não mais somente à explicação dos objetos ou dos fatos. Desta forma, de acordo com suas premissas, poderia-se verdadeiramente estudar a arte e a sociedade, a arte na sociedade, e a arte como a sociedade, mais ainda, a Sociologia da Arte como produção de atores.

HEINICH, Nathalie. A Sociologia da arte. . Tradução de Maria Ângela Caselatto e revisão técnica de Augusto Capella, Bauru, SP: Edusc, 2008.

*Raíssa Moreira Lima Mendes é doutoranda em Ciências Sociais - Sociologia pelo programa de Ciências Sociais da Universidade Federal do Pará - PPGCS-UFPA. Mestre em Ciências Sociais (Sociologia e Antropologia) pelo Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais PPGCSoc-UFMA (2011). Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Gama Filho - RJ (2009). Advogada, graduada em Direito pela Faculdade Santa Terezinha - Cest (2007). Desenvolve pesquisas sobre desenvolvimento na Amazônia brasileira, populações tradicionais, patrimônio cultural, artesanato tradicional, carpintaria naval, ambiente, territórios emergentes e direitos culturais. Tem como foco de sua pesquisa os usos sociais da natureza e gestão de recursos naturais.





2 comentários:

Geovane Maximo disse...

Muito bom o texto observando-o por uma óptica epistemológica, no entanto o debate sobre a sociologia da arte enquanto uma ciência que se propõem a estudar o artista através de seu interior e sua relação social tendo por base sua época,deve superar a questão metodológica de analise da disciplina, e ir além, estuando as relações em sociedade que coagem os sujeitos reprimido sua subjetividade, quanto também as questões que dizem respeito a importância da arte enquanto um requinte essencial para a emancipação dos indivíduos e exercício de liberdade e das potencialidades humanas.

Anônimo disse...

Tens razão, Geovane! Excelente comentário.